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Crítica: O Quarto ao Lado, de Pedro Almodóvar

Atualizado: 12 de fev.


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“O Quarto ao Lado” é o primeiro longa-metragem em língua inglesa de Pedro Almodóvar e a troca do calor hispânico para a frieza desiludida dos Estados Unidos é um dado essencial para a obra. O cineasta compõe os EUA como um país em que as guerras são elementos constitutivo daquela sociedade. Viver no país é ser um sobrevivente sequelado de uma guerra.


Acompanhamos as amigas jornalistas Ingrid (Julianne Moore) e Martha (Tilda Swinton) se reconectando depois de um período de separação. A morte marca a reunião, já que Martha está com câncer. Assim como marca toda a vida desta mulher. Num flashback, o namorado da personagem, traumatizado com a guerra, acaba sendo vítima de um incêndio que tentou combater. Todas as cenas do passado de Martha têm um quê muito americanizado, da Nova Hollywood, das lanchonetes de estrada e das jaquetas jeans. A subjetividade estadunidense se forma a partir deste contato constante com a morte.


Curso imperdível com o crítico e tradutor Irineu Franco Pepetuo e o crítico e Professor Sérgio Rizzo.
Curso imperdível com o crítico e tradutor Irineu Franco Pepetuo e o crítico e Professor Sérgio Rizzo.

A má notícia é que o mundo todo se tornou os Estados Unidos. Como diz o personagem de John Turturro, depois da pandemia de Covid a vida perdeu o brilho. E é esse trabalho de desafetação que Almodóvar opera no filme. Logo ele, um dos mestres atuais do melodrama e da estilização, diminui seus tons, tanto visualmente quanto o da narrativa. “O Quarto ao Lado” é um filme sóbrio na carreira do cineasta, aproveitando de um realismo tipicamente americano.


Mas, não é uma questão apenas de contenção. O movimento do filme só se completa na busca pela beleza típica dos filmes de Almodóvar em meio ao cinza estadunidense. De encontrar o que ainda há de bom na vida, mesmo que estejamos soterrados no neoliberalismo assassino, na crise climática e em plena ascensão do fascismo que já não tem mais vergonha de dizer o próprio nome. A vida na Terra está acabando, mas é preciso viver o declínio com beleza e elegância.


O mundo que ainda reserva respiros de vida, para o cineasta, é um mundo criado a partir da arte. Em que, depois de um susto, ainda é possível assistir ao filme do Buster Keaton e dar as risadas mais puras possíveis. Em que a neve se torna rosa, mesmo que seja por causa da poluição, mas cujo efeito plástico é quase que a materialização na vida de uma obra de Douglas Sirk.


Curso imperdível com o crítico e tradutor Irineu Franco Pepetuo e o crítico e Professor Sérgio Rizzo.
Curso imperdível com o crítico e tradutor Irineu Franco Pepetuo e o crítico e Professor Sérgio Rizzo.

Os quadros de Edward Hopper são a grande inspiração do diretor. O pintor foi um dos artistas que mais entendeu a maldição da modernidade, a alienação. Como diria Marx, com o capitalismo as pessoas sofrem uma tripla alienação: alienam-se de si mesmos, dos outros e do mundo. Nas pinturas de Hopper, os sujeitos estão sempre solitários, em locais impessoais, vagando sem identidade e sem lar.


Imagine, então, como é no capitalismo tardio, nos últimos suspiros de uma forma de organização política, social e econômica representada pelo grande império Estados Unidos.A solução, então, é conectar-se. A alienação isola, nos fecha até para nós mesmos. É preciso abrir-se. A arte promove essa abertura, as relações promovem essa abertura, o sexo promove essa abertura. São esses os antídotos almodovarianos contra o fim da vida.


O cineasta encontra em Moore e Swinton as suas musas. Moore que já se consolidou como atriz ideal de melodramas atuais ao lado de Todd Haynes. Swinton que, junto de Apichatpong Weerasethakul, ultrapassou a própria condição de humanidade, tornando-se uma representante da natureza toda. O plano em que a câmera foca primeiro em montanhas vistas pela janela e depois nas curvas da atriz deitada é a imagem última dessa ideia.


Curso imperdível com o crítico e tradutor Irineu Franco Pepetuo e o crítico e Professor Sérgio Rizzo.
Curso imperdível com o crítico e tradutor Irineu Franco Pepetuo e o crítico e Professor Sérgio Rizzo.

Já que o filme quer se contrapor ao neoliberalismo, é preciso fazer o movimento inverso. Walter Salles, em “Ainda Estou Aqui”, encena o luto privado em meio a uma dor pública, de uma nação inteira. Almodóvar reconhece a dialética entre o ser e o mundo. O sofrimento pessoal faz parte do sofrimento do todo, que é social. Nunca há a individualidade, mas o senso de tragédia coletiva. Tilda é ela e a Terra ao mesmo tempo.


Em “O Quarto ao Lado”, Pedro Almodóvar se aventura numa versão mais sóbria de si mesmo. Mais direta, por assim dizer. Os diálogos, por exemplo, até sofrem com essa tentativa de desafetação, de dizer tudo com todas as letras. Mas, é um percalço que quase combina com o que o filme propõe, já que a busca pela vida que ainda é possível em meio à morte se dá justamente onde não há palavras. Dá-se na encenação dos toques e olhares, das risadas e das memórias. Numa vida que permite uma mentirinha que a romantize. Numa filha que é uma rima poética da mãe. Numa morte que é dura e bela, como um quadro de Hopper.

 

 

Eric Campi (@ericcampi_) é jornalista e pós-graduado em Audiovisual. Já trabalhou em diversos veículos de jornalismo cultural, como na Revista CULT e nos sites Wikimetal e MadSound.




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